sexta-feira, 16 de dezembro de 2011
Bibliofilia
Meu pai foi camponês, com alguma terra, e minha mãe doméstica, filha de um pequeno lavrador que durante algum tempo também foi vendedor de leite, numa antiga mercearia e a vizinhos, antes das fábricas de lacticínios se instalarem na ilha de São Miguel.
Dada a origem social, a minha família não me proporcionou, em criança, acesso aos livros, a não ser a uns poucos velhos manuais escolares que haviam sido de minha mãe. Apesar desta lacuna, desde muito cedo me interessei pela leitura e saciei o meu gosto por ler requisitando o número máximo permitido pela biblioteca ambulante da Fundação Calouste Gulbenkian que mensalmente visitava a Ribeira Seca de Vila Franca do Campo.
Mais tarde, com o meu ingresso no Externato de Vila Franca, continuei a ler não só os livros de leitura obrigatória mas também muitos outros que requisitava na biblioteca fixa da Gulbenkian que existia na Vila ou que me eram emprestados por pessoas que os possuíam.
Com a minha ida para Ponta Delgada para frequentar o antigo sexto ano de escolaridade (actual décimo ano), com todas as economias que conseguia fazer, comecei a comprar os primeiros livros, jornais e revistas. Na altura, 1974, para além de comprar tudo o que se relacionava com a história dos Açores, alguns romances de escritores de renome portugueses, como Eça de Queirós, e brasileiros, como Jorge Amado, também adquiria quase tudo o que se relacionava com as diferentes correntes políticas, nomeadamente as situadas no lado esquerdo do espectro político-partidário.
Alguns anos mais tarde, a minha pobre e pequena colecção foi muito enriquecida com uma oferta que me fez o camponês e investigador autodidacta Manuel Amaral Brum que se encontrava emigrado nos Estados Unidos da América. Com efeito, aquando de uma sua visita a São Miguel fui convidado por ele para o ajudar a seleccionar livros para oferta ao então Instituto Universitário dos Açores e como paga recebi uma fabulosa colecção de livros sobre os Açores, de que destaco as primeiras edições das Saudades da Terra, de Gaspar Frutuoso, e os seis volumes de “A Vila - História de Vila Franca”, a maioria dos volumes de “A vida dos nossos avós - Estudos etnográficos da vida açoriana através das suas leis gerais” e alguns romances, todos da autoria do vilafranquense Urbano de Mendonça Dias.
Com o decorrer dos anos, o meu convívio diário com os livros e com a leitura nunca esmoreceu e ao longo dos tempos fui aumentando a minha colecção quer através da compra de livros, quer das muitas ofertas que recebi. No que a estas diz respeito, destacaria um conjunto de livros, nomeadamente romances, que pertenceram ao jovem artista plástico micaelense José Manuel de Medeiros Cabral e uma dezena de títulos da autoria do Dr. João Anglin, antigo reitor do Liceu Nacional de Ponta Delgada, que este dedicou à sua “antiga aluna e estimada prima Maria Emília Soares Pereira”.
Embora não tenha por hábito ir a sessões de lançamento de livros e de “pedir” dedicatórias aos seus autores, tenho uns tantos que alguns tiveram a gentileza de me enviar com dedicatória. Entre esses livros destacaria “Açores - Origens, Raízes e História”, editado em 1999, que o seu autor, o jornalista e escritor micaelense Manuel Ferreira, escreveu “em honra e louvor de todos os Açorianos que sabem manter a chama viva da Açorianidade e alto o pensamento na exaltação da pequena Pátria Açoriana”.
Sem nunca abandonar a temática açoriana, nos últimos tempos, tenho lido e comprado biografias e publicações diversas sobre a resistência à ditadura de Salazar e Caetano e sobre os primeiros anos após a chamada Revolução dos Cravos.
É deste período que tenho a assinatura mais “famosa”. Está no livro “O imperialismo e a revolução”, editado pelas Edições Bandeira Vermelha, em 1978, e é da autoria de um membro do Partido Comunista do Brasil, o Eng.º Diógenes Arruda Câmara, que foi perseguido e torturado pela ditadura fascista brasileira e que esteve exilado em Portugal, onde desempenhou um papel de relevo na criação do, hoje extinto, Partido Comunista Português Reconstruído e da União Democrática Popular, um dos partidos, também já desaparecido, que esteve na origem da criação do Bloco de Esquerda.
Diógenes Arruda e Jorge Amado foram grandes amigos, de tal modo que o famoso escritor brasileiro fez dele uma das personagens (Vítor) e a ele dedicou o seu romance “Subterrâneos da Liberdade”.
Teófilo Braga
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