José
do Canto e o concelho de Vila Franca do Campo
Tenho
dedicado os últimos textos a divulgar o meritório trabalho de José do Canto em
prol do desenvolvimento da nossa terra. Neste, procurarei divulgar um pouco do
que foi o seu labor no concelho de Vila Franca do Campo. Para tal, usarei como
principal fonte a tese de doutoramento, da autoria do arquiteto Pedro Maurício
Borges, intitulada “O desenho do território e a construção da paisagem na ilha
de São Miguel, Açores, na segunda metade do século XIX, através de um dos seus
protagonistas”.
Para
um melhor conhecimento da vida e obra de José do Canto recomenda-se a leitura
da referida dissertação que teve como motivação de fundo “contribuir para a
história da paisagem de S. Miguel”. Segundo o seu autor, José do Canto “ não é
um arquiteto, paisagista ou engenheiro militar. É um lavrador, que foi também
bibliófilo, botânico, paisagista, sportsman, e, esquecendo o conselho do
agrónomo romano Colunella para não ser edificador, também fez de arquiteto e
mestre-de-obras.”
A
propósito de recomendações, também se aconselha, a quem se interessa pela
evolução da paisagem e pela introdução de espécies vegetais na ilha de São
Miguel, a leitura de um pequeno livrinho intitulado “Alguns aspetos de
intervenção humana na evolução da paisagem da ilha de S. Miguel (Açores)”, da
autoria do arquiteto paisagista José Marques Moreira, reconhecido especialista em plantas ornamentais e pedagogo
exemplar.
No
que concerne ao concelho de Vila Franca do Campo, José do Canto administrou uma
vasta área que incluía a Lagoa do Congro e que ia do Porto Formoso à Ribeira
das Tainhas.
No
seu prédio em Vila Franca do Campo, o maior de toda a Casa, José do Canto
promoveu, segundo Pedro Borges, a domesticação da “paisagem silvestre com a
sequência de operações de arroteamento, vedação e abertura de caminhos de
penetração” e através da edificação de “infraestruturas de apoio à produção”.
Em
Vila Franca do Campo, com o fim de aumentar a produtividade da terra
disponível, a par das pastagens artificiais que criou, José do Canto cultivou
milho, trigo, leguminosas e plantou e replantou várias espécies vegetais, de
que se destacam pinheiros, buxos, vinháticos, carvalhos, criptomérias, faias da
Holanda e eucaliptos.
A
par com as atividades económicas já referidas, José do Canto aproveitou o
espaço envolvente à Lagoa do Congro para o recreio, criando uma mata ajardinada
que, segundo Isabel Albergaria, alia a “função utilitária de “mata de corte”
com uma função de recreio (ou de pleasure ground) – concretizada no número e
variedade de plantas exóticas e ornamentais, nos seus passeios e na profusão de
vistas”. Estes últimos aspetos eram, ainda, bem visíveis há cerca de quarenta
anos, onde era possível observar, nas margens dos caminhos de acesso à lagoa, entre
outras plantas, cameleiras e azáleas, cujas flores davam um colorido que fazia
esquecer o esforço físico das caminhadas.
Não
se sabe quando começou a tradição de festejar o São João na mata ajardinada da
Lagoa do Congro, contudo os senhores Eduardo Calisto do Amaral, José Cabral e
Manuel Inácio de Melo atribuem a autorização para tal ao Dr. Guilherme Poças
Falcão, casado com Maria Guilhermina, filha de José do Canto, o qual nas vésperas
do dia mandava proceder a arranjos e a limpezas nos caminhos.
A
comemoração do dia de São João na Lagoa do Congro é uma tradição que merece ser
retomada e a mata ajardinada, criada por José do Canto e mantida pelo seu genro,
deve ser alvo de um trabalho de recuperação que tarda em ser implementado.
Em
2010, no prefácio da brochura “Lagoas do Congro e dos Nenúfares- Proposta de
recuperação e gestão da cratera” escrevi que a aquisição de parte da cratera da
Lagoa do Congro e a classificação do espaço como Área Protegida eram passos
dados no sentido da sua valorização.
Hoje,
desafio as autoridades que tutelam as Áreas Protegidas dos Açores e a Câmara
Municipal de Vila Franca do Campo a darem mais um passo, que deverá ser o da
criação de um Jardim Botânico que sirva de espaço educativo e recreativo para a
população do concelho e de toda a ilha, bem como de polo do “Garden Tourism”,
nicho turístico que está em franco crescimento em todo o mundo.
T.
Braga
(Correio
dos Açores, nº 30357, 11 de junho de 2014, p.11)
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