sábado, 30 de março de 2013
Trabalhar Menos, Viver Melhor
John Keynes, em 1930, previa que no início do século XXI a semana de trabalho estaria reduzida a 15 horas. Dizia ele que não precisaríamos de jornadas de trabalho muito longas para ganharmos o suficiente para a satisfação das necessidades materiais.
Se é verdade que a previsão de Keynes não se cumpriu, também não deixa de ser verdade que as políticas que têm sido seguidas têm prometido o paraíso para todos, mas na realidade para a maioria da população tem oferecido o contrário.
Se até há alguns anos acenava-se com a cenoura de mais trabalho para mais consumo, muitas vezes acima das possibilidades de cada um e para além dos recursos naturais disponíveis, hoje não há qualquer pejo em propor mais trabalho (mais horas diárias e maior idade de aposentação) e menor remuneração.
Contra estas soluções “milagrosas” que pressupõem um retrocesso no que diz respeito a direitos sociais conquistados pelas classes trabalhadoras ao longo de muitos anos de sacrifício, a organização NEF (The New Economics Foudation), um laboratório de ideias que trabalha em prol de uma economia que tem em conta as pessoas e o planeta, defende uma semana de trabalho de 21 horas.
Segundo a organização, uma semana de trabalho mais curta proporcionaria as bases para uma vida melhor, por duas razões:
- A redistribuição do trabalho remunerado levaria a uma sociedade mais igualitária;
- Se gastarmos menos horas de trabalho remunerado para manter os errados hábitos de consumo atuais, poderíamos aproveitar este tempo para fazer coisas que valorizamos mas que nunca temos disponibilidade, como estar mais tempo com os filhos, familiares e amigos, fazer voluntariado, etc.
Os ecologistas, não cooptados pelos valores do capitalismo puro e duro ou do capitalismo versão verde ou sustentável, desde sempre tiveram uma posição muito crítica relativamente ao trabalho que era considerado por Paul Lafargue, em 1883, uma “estranha loucura de que estão possuídas as classes operárias das nações onde reina a civilização capitalista”.
Alguns deles, com os quais estou de acordo, manifestaram a sua incompreensão pelo facto do progresso tecnológico ter contribuído apenas para o aumento da produção e não ter levado ao aligeiramento do trabalho humano.
Para tentar inverter a situação, algumas personalidades e grupos ecologistas apresentaram propostas que importa serem do conhecimento público. Assim, em 1974, René Dumond, engenheiro agrónomo francês, no seu Manifesto Eleitoral apresentado aquando da sua candidatura às eleições presidenciais intitulado “Para uma outra civilização”, defendeu, entre outras medidas, a “reconversão de toda a produção industrial no sentido de artigos mais duradouros, mais úteis e menos poluidores” e “medidas sociais, tais como a redução dos horários e as cadências de trabalho”.
A prestigiada rede internacional “Amigos da Terra”, num seu programa de 1976, também apresentou um conjunto de medidas que a serem levadas à prática levariam à redução do trabalho necessário. Assim, e de imediato a proposta era a de que a semana de trabalho fosse reduzida para 30 horas.
Segundo aquela organização o que se pretendia era, por um lado diminuir a parte do trabalho que tinha como único objetivo proporcionar um salário e, por outro lado “desenvolver a do trabalho “livre” (que estimula a criatividade e o interesse do trabalhador, ou que ele próprio está em condições de controlar o resultado”.
Será realizável a redução do horário para as 21 horas semanais?
A NEF acha que sim, porque as 21 horas não estão longe do tempo médio que as pessoas em idade de trabalhar dedicam ao trabalho remunerado. Com efeito, a título de exemplo, em Espanha, em 2011, considerando todas as pessoas com idades entre os 15 e os 64 anos, a média de horas de trabalho semanal remunerado era de 18,94.
Já sei que me vão dizer que estas propostas não passam de fantasias de quem não tem os pés bem assentes na terra e que são irrealizáveis. Como muito bem escreveu o ex- presidente da Assembleia da República Henrique de Barros, no prefácio ao livro Utopia ou Morte, de René Dumont, “ as loucas fantasias de hoje…serão as sensatas realidades de amanhã”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, nº 2759, 27 de Março de 2013, p.16)
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