António
Guilherme Francisco: oposicionista ao salazarismo
O
movimento das forças armadas que a 25 de abril de 1974 instituiu um regime de
democracia pluralista foi recebido, em Vila Franca do Campo, com algum receio
por parte dos apoiantes do regime deposto e com indiferença, ou mesmo
desconfiança, por parte da maioria da população.
Como
terá acontecido um pouco por todo o lado, foram os jovens recém-licenciados ou
os que ainda estavam a completar estudos nas universidades no continente, os
principais apoiantes do novo regime, pois em Vila Franca do Campo não existia,
ao que sabemos, qualquer núcleo da chamada oposição democrática.
Também,
como sucede sempre que há mudanças bruscas, os adeptos da ordem vigente optam
por resistir às mudanças, sobretudo quando avaliam que as mesmas poderão ser
revertidas a curto prazo, refugiam-se na inação à espera de melhores dias ou
convertem-se aos novos regimes, tirando daí o máximo de dividendos possíveis.
Vila
Franca do Campo não fugiu à regra, tendo acontecido um pouco de tudo. Desde,
pelo menos um membro da ANP, na prática o partido único existente durante o
Estado Novo que resultou na alteração da União Nacional, que passou a colaborar
com o MDP-CDE até à inclusão de vários apoiantes do marcelismo nos diversos
partidos que surgiram com o 25 de Abril.
Também,
tal como acontece um pouco por todo o lado, as pessoas que podiam beneficiar
com a ocupação de lugares nas diversas instituições, nomeadamente nas
autarquias, aderiram aos partidos que estão ou têm maior possibilidade de
chegar ao poder. O primeiro partido beneficiado foi o PSD - Partido Social
Democrata e posteriormente o Partido Socialista, que ao longo dos anos se foi
descaracterizando, não só com a viragem à direita que é comum a todas as forças
partidárias, mas também com a adesão de membros do PSD, que foram perdendo eleições
internas, e simultaneamente com a inclusão de membros ou simpatizantes de
partidos situados à sua esquerda.
Mas,
se quisermos falar em quem efetivamente se opôs à ditadura, o número de
vilafranquenses foi bastante reduzido.
De
entre eles, destaca-se o nome de António Guilherme Francisco, natural de
Mogadouro, que foi membro da maçonaria, tendo feito parte da Loja Antero de
Quental que foi criada, em Vila Franca do Campo, a 13 de Agosto de 1932.
No
ano seguinte, na sequência de interrogatórios que ocorreram após a prisão de
vários membros da maçonaria, chegou-se a acusar António Guilherme Francisco,
então cabo de mar, de colaborar na introdução de armas em São Miguel, através
do veleiro Celestina Duarte. Tal acusação caiu por terra, pois segundo se
apurou o barco havia descarregado sal e não armas.
De
acordo com o Dr. Carlos Melo Bento, António Guilherme Francisco chegou a ser
preso pela PIDE que o foi buscar a casa e remetido para “o Forte de Angra do
Heroísmo, onde um tribunal militar sumariamente o condenou a alguns anos de
prisão” que felizmente não teve de cumprir. Ainda segundo o mesmo autor,
António Guilherme Francisco havia sido “vítima de denúncias feitas por
encomenda de rivais comerciais”.
Para
além de contribuir com apoio financeiro para a oposição, António Guilherme
Francisco foi, também, um dos subscritores da “Declaração de Ponta Delgada”,
“plataforma eleitoral com vista às eleições de 1969”, em cujas conclusões pode
ler-se o seguinte:
“O nosso primeiro
objetivo é exatamente sacudir o torpor da gente açoriana, libertá-la do
bloqueio moral, mais do que geográfico, em que tem vivido e levá-la a
compreender que o seu primeiro dever, enquanto cidadãos, é a intervenção na
vida pública para a defesa dos seus próprios interesses, para a edificação de
uma sociedade mais justa e humana, a começar precisamente por aquela em que
vive”.
Quem
vive ou acompanha de perto a vida social em Vila Franca do Campo facilmente se
apercebe das dificuldades com que vivem muitas famílias, da apatia de grande
parte dos cidadãos face à participação na vida social e política, do medo em
contribuir com as suas sugestões ou críticas, mesmo que construtivas, da
clivagem em que a sociedade está dividida (alguém me dizia que existiam duas
tribos cujo combate nunca terá tréguas). Assim, enquanto a democracia for
apenas uma formalidade, o 25 de Abril do Povo continuará por se fazer.
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, nº 30322, 16 de Abril de 2014, p.14)
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